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Fugir

F

Silvia C.S.P. Martinson

À longe vou caminhar
e ninguém me vai encontrar,
porque vou andar
por estrelas e galáxias
nos céus acima daqui.
E por lugares distantes
a alegria e a paz acharei.
A esquecer e apagar
da Terra e de meu lar,
do meu coração o farei,
de um amor desmedido
que quis ofertar,
desprezado por medo,
medo de voltar a renascer.
Vou a muito longe andar
em busca da noite, do luar,
das estrelas, que sobre a tundra
sua luz deixam, ao escurecer,
até que que um novo dia;
a termine por romper.

Eu sei

E

Silvia C.S.P. Martinson

Sei que lembrarás de mim,
no vento que passa,
na flor que se abre,
na primavera que chega,
na chuva que se vai.
Lembrarás eu sei,
na saudade que fica,
no verde do mar,
no profundo sentido,
da onda que se esvai,
no ciclo dos tempos
e na lágrima que cai.
Sei que lembrarás, eu sei,
em cada dia que nasce,
em cada tarde que morre,
na noite que chega silente,
como a gota,
compassada, dolente,
nas águas mansas que seguem,
na palmeira que se debruça
e na sombra dos pinheirais.
Na tristeza de mais um sonho,
teu, que na bruma se esvai.
Eu... Sei.

Convite

C

Silvia C.S.P. Martinson 

Leva-me a caminhar pelas estradas.
Faz-me esquecer do que não quero,
daquilo que junto a mim
ainda resta e perdura,
desta solidão, toda a amargura
daquela ausência tão tua.

Quero andar junto a ti, loucuras
as minhas, querer-te tanto assim
que como o perfume do jasmim
em meu corpo, tu, ainda perduras.

E me perderei em teus braços,
em mil beijos e abraços
a noite nos verá entrelaçados
de tudo e todos esquecidos.

Deixa-me ouvir-te? Não me canso,
tua voz a mim é remanso
quando aceitas o convite feito,
embalas os meus sonhos.

E em teu peito, enfim, descanso.

Acalanto II

A

Silvia C.S.P. Martinson 

Embalo e canto...
Canto e embalo!...
E cantando me encanto
com estórias de fadas,
sílfides; duendes e gnomos,
que se perdem nas estradas
da imaginação... A criança,
que trago em mim,
a que sou inda assim...
Cabeceia e quase adormece!...
E no acalanto
deste meu canto,
vou embalando;
ninando; o infante,
que não sou eu,
a que seguro e abraço.
As sílfides, a fada,
as bruxas, os gnomos,
esvaem-se no sono
e... Perdem-se no nada!

Tradição de Ano Novo

T

SIlvia C.S.P. Martinson 

Aquele ano seria diferente.
Povoado de Ornaisons – França.

Um povoado pequeno com mil e poucos habitantes e algumas peculiaridades, diferente dos demais povoados.

Viviam ali produtores rurais dedicados a vitivinicultura, de cujos parreirais se extraiam uvas de fina casta para a elaboração de vinhos de alta qualidade, tão apreciados em toda França. Produziam também cervejas de boa cepa provenientes da cevada ali cultivada.
Também em menor quantidade se criavam ovelhas e cabras destinadas ao consumo doméstico e à produção de lã que a seu tempo, após a tosa, era encaminhada às industrias de tecelagem que, posteriormente, enviavam os lindos tecidos aos costureiros para a fabricação de roupas e abrigos para o inverno.

Bem, voltando à história nos contaram que; não eram mais crianças, haviam crescido. Estavam quase todos com 16 a 18 anos mais ou menos. Cresceram juntos.

Quando crianças esperavam a noite de Ano Novo com ansiedade.
O dia transcorria com alguma agitação, tanto de parte dos adultos quanto das crianças.
Os adultos no preparo da casa, das roupas melhores e da ceia que deveria ser diferenciada dos demais dias e do que costumavam comer o ano todo.

Na passagem para o ano a ceia, que ocorria a meia noite, compunha-se de carne de porco, saladas mais elaboradas, vinhos mais finos e por certo de sobremesas mais saborosas que o normal.

As crianças e os adultos banhavam-se mais cedo e vestiam-se, como era o costume, com mais esmero, até porque é inverno nesta época do ano ali.

Era costume desde os antigos que na madrugada do dia 1 de janeiro os jovens do povoado saíssem a recorrer as ruas e pegar tudo que estivesse nas portas das casas ou jardins sem que o proprietário pudesse perceber e colocavam o produto no centro da praça local onde também ficava a prefeitura.

Os jovens saiam então de madrugada de diversos pontos da cidadezinha e carregavam tudo que encontravam depositando no centro da praça.

Aquele ano foi excepcional pois que carregaram bicicletas, vasos de flores, lixeiras e até um automóvel, que com a ajuda de uns quantos, conseguiram abrir a porta do motorista, destravar o veículo e o empurrar até a praça.

Os antigos já haviam esquecido este costume e quando acordaram pela manhã se deram conta da ausência de seus pertences. Foi um alvoroço no povoado. Eram pessoas correndo pelas ruas procurando o que lhes pertencia.

Quando chegaram ao centro do povoado e viram com espanto a praça lotada de badulaques das mais diversas espécies ficaram estarrecidos. E os jovens postados à parte, entre sorrisos, observavam as reações dos pretensos prejudicados com a brincadeira.
Foram duramente inquiridos sobre se haviam sido eles os autores dos desvios, ao que respondiam com a maior desfaçatez:

- Não eu não! Nem pensar que eu seria capaz de tal maldade!

Porém o faziam entre sorrisos e olhares matreiros de uns aos outros.

No entanto, o mais interessante se deu após alguns minutos quando as pessoas começaram a recolher seus pertences. Aí então é que a natureza torpe do homem se fez ver.

Alguns acharam que os pertences de seus vizinhos eram mais valiosos que os seus e começaram a arguir que estes lhes pertenciam. O caos se instalou definitivamente e os prejudicados após reclamarem os seus direitos e não serem atendidos, partiram para a agressão física.

Velhos amigos se destrataram, amizades se desfizeram, pessoas que se tinham por idôneas e honestas deixaram cair a máscara por um simples vaso de flores.

Tudo isto ocorreu ante os olhos estupefatos dos jovens que tinham em alguns vizinhos e até parentes a representação da mais pura honradez.

Esta data ficou gravada na memória e nos anais da história deste povoado.

E hoje por precaução e experiência, os enfeites, vasos, jardineiras e demais objetos que se encontram ordinariamente nas ruas e jardins são recolhidos após a ceia de Ano Novo, na passagem do dia 31 de dezembro a 01 de janeiro, ao interior da casa de cada proprietário.

Oh! Esqueci-me de contar:

Naquele dia também foi desfeito um noivado que já durava alguns anos.
Os pais dos noivos brigaram por uma bicicleta velha e não permitiram o casamento de seus filhos. A noiva até hoje chora desconsolada, ficou mal vista e restou solteirona. O noivo foi para outra cidade, lá se casou e teve um “montão” de filhos.

Diga-se de passagem, e para quase finalizar que foi ele um dos líderes que arquitetou toda a brincadeira. Até hoje contam, os que eram jovens a época, que quando saem à rua e encontram as pessoas que tentaram roubar o que não era seu, as identificam e lhes lançam palavras como:

- Eu sei o que você fez!

Meus olhos

M

SIlvia C.S.P. Martinson 

Meus olhos sonhadores
são como as águas marinhas
profundas, inescrutáveis.
Há histórias neles contidas
de ilusões que a muito,
muito tempo vivi.
Eles veem mais longe,
e expressam inumeráveis esperanças,
se alegram na fantasia,
não vivem do passado,
esquecem-se da tirania.
Sabem sorrir sem palavras,
ao renascer cada dia,
para viver, amar e ser feliz.
São a luz que se derrama
como as ondas do mar,
nas calmas, tranquilas
praias da vida,
eternamente a sonhar.

Lápis

L

Silvia C.S.P. Martinson 

Dispensei-o a tanto...
Obsoleto ficou
entre:
...“mal traçadas linhas”,
rabiscos, desenhos,
cartinhas.
Lembranças de jovem,
de quando tinha serventia .
Foi apequenado, c’o tempo,
pelo uso improvisado.
Transmitia recados,
juras e traços...
Encontro-o hoje,
o toquinho,
entre as páginas
amarelecidas de um passado,
na gaveta, n’um escaninho,
meu pequeno lapisinho.
Pobrezinho!
Troquei-o por uma caneta,
que se diz compacta,
uma tal de ... Esferográfica.
Que rata!

Plumas

P

Silvia C.S.P. Martinson

Voarei como as plumas ao vento
ao encontro de teu leito.
Ali repousarei um momento
até que me eleve o lamento
da vida a me chamar.
Então quando o dia clarear,
novamente e somente então,
voltarei a sorrir e a amar.
E nos recônditos de teu peito,
como as plumas ao vento,
levemente, suavemente,
pousarei ali...Para ficar.

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