Silvia C.S.P. Martinson
O prédio era alto, uns quinze andares. Moderna arquitetura. Amplas sacadas.
Portas-janelas que nas sacadas davam visão plena da rua.
Era azul e se confundia com o céu resplandecente que costuma acontece nestes pagos do Mediterrâneo, em Campello um “pueblo” de Alicante- Espanha.
Frente a ele há um grande parque arborizado e provido de muitos bancos para sentar e apreciar a placidez do ambiente.
Ali me sentava quase todos os dias para ler, pensar e observar.
Em uma manhã em que me encontrava sentada, depois de minha caminhada diária, em um banco frente a este prédio a vi...
De longe me pareceu mais ou menos jovem, cabelos castanhos, curtos, que reluziam ao sol.
Devia habitar o décimo ou décimo primeiro andar. Realmente não havia como calcular corretamente.
O que me chamou a atenção do lugar em que me encontrava na praça era que: ela entrava rapidamente por uma porta desaparecendo a seguir para sair por outra em poucos minutos depois. Isto sucessivamente, sem parar, por quase uma hora.
Voltei a caminhar pela praça nos dias seguintes como sempre fazia.
Aí, então, a curiosidade já me aguçava sobremaneira e passei diariamente, ao levantar os olhos, a observar a mesma cena. Meses a fio.
Queria saber quem era e o que fazia aquela mulher.
Dirigi-me ao prédio em que morava e falei com o porteiro que pouco soube me informar dizendo que não a conhecia e que esta nunca descia à rua.
A ele lhe parecia que era casada, todavia não tinha certeza.
O tempo passou e a cena se repetiu até que um dia não mais a vi.
Parecia-me de longe tão bonita.
Retornei ao prédio novamente e ao novo porteiro perguntei por ela.
Este era mais falador.
Contou-me então que a bela mulher vivia confinada em seu apartamento.
Que quando o marido saia trancava a porta e levava a chave com ele.
Era demasiadamente ciumento.
Um dia ao retornar a casa mais cedo encontrou em seu interior o antigo porteiro entabulando com a mulher amigável conversa.
Possuído pela desconfiança e pelo ciúme exacerbado puxou de um revólver que carregava consigo e aos dois, sem nada perguntar, matou.
Soube-se, segundo me narrava este último, que o antigo porteiro arrombara a porta, ao ouvir os gritos da mulher, para apagar um fogo que se instalara na cozinha e que logrou sucesso na empreitada.
Segundo alguns vizinhos ainda hoje se ouvem os passos da mulher a circular de um quarto a outro, sem parar, e que da praça quem olha para aquele apartamento a vê sempre da mesma forma, caminhando. Agora ao lado do antigo porteiro.
Os dois todos os dias, por uma hora, pela manhã, faça sol ou chuva, entram por uma porta e saem pela outra, caminhando, sempre caminhando...
Incrivel! Hoje pela manhã me pareceu vê-los.