Silvia C.S.P. Martinson
O conheci quando era eu ainda muito jovem.
Era vizinho de meus tios e primos.
Viviam em, casas situadas uma ao lado da outra e somente separadas por uma cerca que isolava os jardins contidos em cada uma delas.
O bairro era simples porém muito habitado e bem localizado dentro da cidade então, até hoje, a capital do Estado do Rio Grande do Sul – Brasil. A cidade chamava-se e ainda se chama Porto Alegre.
Pois bem, nesta rua e numa destas casas nasceram meus primos Pedro e Margarida. Eram seus pais, minha tia Luiza e seu marido Oscar.
Pedro e Margarida, que era a menor dos dois, ali creceram, se educaram e casaram.
Já o vizinho ao lado que se chamava Genaro, de origem italiana, como bem o demonstra seu nome, era uma pessoa muito extrovertida.
Como todo italiano, até aonde se sabe, tinha uma voz potente e quando estava em casa de volta de seu trabalho, no verão, ficava de bermudas e uma camiseta sem mangas que mostrava toda sua enorme barriga pois que, geralmente, como todos de sua raça, gostava de comer boas e suculentas comidas.
Pois assim era Genaro naqueles tempos.
Ele ia ao quintal de sua casa e ali ficava, em alta voz, a cantar as músicas de que gostava em italiano.
A mulher de Genaro chamava-se Yolanda e como ele, também, era de origem italiana. Os dois tinham duas filhas, muito educadas que, com o passar dos anos e o estudo, se tornaram professoras, o que para a época significava, para as mulheres, quase o máximo de educação que poderiam alcançar as filhas de operários se não se tornassem dependentes de maridos e mães de família.
Estas senhoritas chamavam-se respectivamente Andréa e Sofia. Nasceram, cresceram e casaram-se naquela rua.
Junto com meus primos passaram toda a infância ali, brincando, brigando e discutindo, todavia apoiando-se mutuamente quando necessário.
E assim a vida seguiu seu ritmo normal até a adolescência e maioridade deles, quando então, cada um de acordo com sua vocação foi trabalhar.
Voltemos então a Genaro.
Genaro era um homem muito alegre e um grande contador de histórias e anedotas a que todos os vizinhos gostavam de ouvir e rir muito quando ele assim as narrava, o que acontecia frequentemente.
Outra mania que se conhecia de Genaro era de que aos domingos ele se arrumava com suas melhores roupas e ia ao Prado para apostar nos cavalos de corrida.
Quando perguntado aonde ia tão elegante ele, entre risos e chacotas, dizia que ia visitar sua amante favorita. E ante a sua maneira de ser todos ficavam a rir de sua forma jocosa de falar dos cavalos. Inclusive sua mulher e filhas.
E assim os anos se passaram saindo Genaro todos os domingos à tarde para ir ao Prado, sempre sozinho.
Acontece que por ser muito comilão e já ter uma idade mais ou menos avançada, em um fim de semana, mais precisamente em um domingo, ao final da tarde, depois de voltar do “Prado”, Genaro sofreu um infarto fulminante e morreu.
Minha família foi avisada e compareceu ao féretro. No dia do enterro, mais precisamente no velório, na capela, quando ali se encontrava o morto, a família e os amigos, chegou uma senhora acompanhada de três filhos a quem ninguém conhecia.
Ela se aproximou do caixão, chorava muito e exclamava: Genaro! Genaro! Amor de minha vida! Aqui estou com nossos filhos para dar-te a despedida! Porque te vais e deixas a mim tua Prado? Sim, tua Prado! A mulher de toda tua vida!
Os amigos se benzeram, o padre suspendeu as orações pelo morto, as filhas ficaram perplexas se estarrecidas.
A viúva Iolanda arregalou os olhos, foi ao caixão, fechou a tampa com um estrondo e caiu, ao chão, desfalecida.
Os amigos e a família se retiraram e somente restou ao lado do morto Genaro sua sempre e querida Prado.